De acordo com um estudo publicado na Nature, o fenômeno conhecido como “volatilidade hidroclimática” descreve mudanças repentinas e extremas entre períodos prolongados de seca e condições intensas de umidade. Essas flutuações resultam em “choques climáticos”, como chuvas torrenciais que provocam enchentes devastadoras – uma ocorrência cada vez mais frequente à medida que as temperaturas globais aumentam, devido à mudança climática induzida pelo homem.
Os cientistas documentaram mudanças significativas nos padrões de precipitação nas últimas décadas. Embora a precipitação anual total tenha permanecido relativamente estável ou aumentado ligeiramente em muitas regiões, os eventos de chuva estão se tornando mais curtos, mas significativamente mais intensos. Essa mudança significa menos dias chuvosos em geral, mas chuvas mais fortes e concentradas quando ocorrem, aumentando os riscos de inundações.
O potencial destrutivo desses eventos climáticos extremos ficou evidente em Valência, na Espanha, em 29 de outubro de 2024, quando uma inundação catastrófica fez com que 1.000 metros cúbicos de água por segundo atravessassem a área. O desastre custou 224 vidas e resultou em graves danos materiais e econômicos.
Embora seja quase impossível evitar totalmente esses eventos, a engenharia há muito tempo oferece soluções para atenuar seu impacto. Entre elas, os tanques pluviais se destacam como um mecanismo de defesa fundamental contra inundações catastróficas.
Como Funcionam os Tanques Pluviais

Um tanque pluvial é uma estrutura subterrânea maciça de concreto projetada para evitar que a água da chuva sobrecarregue o sistema de esgoto durante chuvas fortes.
Sua operação é simples e eficaz. Durante tempestades intensas, os tanques pluviais retêm temporariamente o excesso de escoamento e, em seguida, liberam a água armazenada gradualmente, evitando que as estações de tratamento de águas residuais excedam sua capacidade máxima.
Para que um tanque pluvial seja eficaz, sua capacidade de armazenamento deve ser suficiente para lidar com a chuva a uma taxa de 10 litros por segundo por hectare por pelo menos 20 minutos. Esse nível de precipitação pode levar detritos, sedimentos e poluentes das ruas para os sistemas de drenagem, que, sem a devida intervenção, fluiriam diretamente para os cursos d’água.
Antes de entrar nos tanques, as águas pluviais passam por sistemas de filtragem que capturam poluentes como derramamentos de combustível ou óleo, bitucas de cigarro, folhas, terra, resíduos plásticos, garrafas, latas e até mesmo dejetos de animais. Esse processo ajuda a evitar a contaminação de rios e lagos.
Proteção de Rios e da Qualidade da Água

Os tanques pluviais desempenham um papel fundamental no gerenciamento de grandes volumes de água de córregos naturais e escoamento urbano, regulando sua liberação na rede de saneamento de forma controlada. Isso não só ajuda a reduzir os riscos de inundação, mas também evita que as descargas poluídas cheguem aos rios, garantindo a sustentabilidade ambiental e a qualidade da água.
Para que os tanques pluviais sejam eficazes em sua dupla função, eles devem ser estrategicamente posicionados dentro da rede de drenagem, especialmente perto dos pontos de descarga onde a água é liberada de volta ao meio ambiente. A regulagem do fluxo interno também é fundamental – as válvulas gerenciam os fluxos baixos, enquanto as comportas controlam os fluxos altos durante eventos climáticos extremos.
Além disso, os principais fatores operacionais devem ser considerados: se o tanque será esvaziado por gravidade, com bombas ou um sistema híbrido, qual método de limpeza será implementado (manual ou automático) e se as tecnologias de monitoramento e controle remoto serão integradas para otimizar a eficiência e a manutenção.
Madrid tem o Maior Reservatório de Águas Pluviais do Mundo
As cidades com infraestrutura avançada estarão mais bem equipadas para lidar com as inundações induzidas pelas mudanças climáticas, incluindo eventos climáticos extremos.
A Espanha se posicionou na vanguarda do gerenciamento de águas pluviais, com 470 tanques pluviais em cidades como Sevilha, Valência, Alicante e Bilbao. No entanto, a Comunidade de Madrid se destaca não apenas por ter uma das mais extensas redes de tanques pluviais do mundo, mas também por abrigar o maior tanque pluvial do planeta.
Localizada em Arroyofresno, essa instalação de 35.000 m² atinge uma profundidade de 22 metros. O coletor de água foi construído usando uma máquina de perfuração de túneis, com um diâmetro interno de 6,70 metros e 3 quilômetros de comprimento. Construído sob um campo de golfe, o tanque pode armazenar até 400.000 m³ de água – oito vezes o volume do icônico lago El Retiro de Madrid, onde os turistas andam de barco a remo pelo parque mais famoso da cidade.
Juntos, o tanque Arroyofresno e o tanque de tempestade Butarque, também localizados em Madrid, armazenam e redistribuem aproximadamente 8 hectômetros cúbicos de água da chuva por ano, reduzindo significativamente o risco de inundações urbanas.
Tóquio: Um Sistema Sofisticado para Conter a Água
O sistema de drenagem altamente avançado de Tóquio serve de modelo para as cidades que estão lutando pela prevenção de enchentes. No centro desse sistema está seu enorme tanque de tempestades, um componente essencial do MAOUDC (Metropolitan Area Outer Underground Discharge Channel, Canal de Descarga Subterrânea Externa da Área Metropolitana).
Essa vasta rede de túneis e câmaras cilíndricas, que se estende por 6,3 quilômetros e está localizada a 50 metros abaixo da superfície, desempenha um papel crucial na proteção do norte de Tóquio contra inundações graves.
Reconhecido como o maior sistema de desvio de água subterrânea do mundo, o projeto exigiu um investimento de mais de US$ 2 bilhões. No entanto, seu impacto foi notável, reduzindo em 90% os danos às residências relacionados a enchentes.
Além do brilhantismo de sua engenharia, a instalação também se tornou uma atração turística inesperada, oferecendo visitas guiadas por seus enormes túneis e abóbadas subterrâneas inspiradoras.
Londres e o Desafio de Aproveitar o Tâmisa
Londres adotou uma abordagem diferente para lidar com tempestades e inundações do rio Tâmisa. A Barreira do Tâmisa, um sistema de 10 portões maciços de aço – cada um tão largo quanto a abertura da Tower Bridge – serve como defesa contra inundações, protegendo uma área de 125 quilômetros quadrados.
No entanto, com a previsão de que o nível do mar suba cerca de um metro até 2100 e as tempestades se tornem mais intensas, as autoridades de Londres já estão planejando medidas adicionais. Essas medidas incluem a elevação dos muros de contenção em meio metro e a construção de reservatórios a jusante para armazenar o excesso de água das enchentes, garantindo proteção de longo prazo para a cidade.
Rumo às Cidades-Esponja
Os tanques pluviais são uma solução econômica, de baixo impacto e ambientalmente benéfica para o gerenciamento do excesso de água dos sistemas de drenagem urbana. No entanto, sua manutenção é exigente devido à alta umidade, aos gases corrosivos e ao acúmulo de lodo, o que os torna propensos a desafios operacionais.
Por exemplo, no tanque pluvial de Butarque, em Madrid, grandes quantidades de fibras e trapos entupiam as bombas de drenagem, causando ineficiências. Para resolver esse problema, foi implementado o sistema BioCut Vogelsang, um macerador projetado para triturar resíduos e proteger as bombas e a infraestrutura geral contra bloqueios e danos.
À medida que as cidades buscam soluções sustentáveis e de longo prazo, o conceito de cidades-esponja está ganhando força. Essas áreas urbanas incorporam infraestrutura baseada na natureza para absorver o excesso de água por meio de jardins de chuva, sistemas de biorretenção e parques inundáveis. Um dos exemplos mais ambiciosos é encontrado em Wuhan, na China, conhecida como a cidade dos cem lagos, que desenvolveu 389 projetos de cidades-esponja, abrangendo 38,5 quilômetros quadrados.
A China tem estado na vanguarda desse movimento, com mais de 640 projetos de cidades-esponja em 250 municípios desde 2015. O objetivo final é que, até 2030, 70% da água da chuva nessas cidades seja absorvida em vez de se acumular nas ruas. Como Kongjian Yu, arquiteto paisagista e professor da Universidade de Pequim, afirma sabiamente: “Não se pode lutar contra a água; é preciso se adaptar a ela”.